Após o devastador terremoto e tsunami de 2011, que provocaram o vazamento de radiação na usina nuclear de Fukushima, a região enfrentou um longo caminho de recuperação. Com o trágico evento, que resultou na morte de mais de 18 mil pessoas, muitos áreas se tornaram inabitáveis e o medo da contaminação se espalhou por todo o Japão. Quatorze anos depois, um jovem agricultor, Takuya Haraguchi, está determinado a revitalizar a região e reverter a percepção negativa que se formou após a catástrofe.
Na época do desastre, Haraguchi tinha apenas 11 anos e residia em Osaka, distante 800 quilômetros da zona afetada. Ele se lembrará para sempre do impacto emocional que o acidente nuclear teve em sua infância, temendo que a radiação tornasse o Japão inteiro inabitável. Com aproximadamente 11 mil moradores evacuados de Okuma e mais de 80 mil pessoas forçadas a deixar a região de Fukushima, a realidade foi dura. Entretanto, agora, aos 25 anos, Haraguchi se mudou para Okuma, a poucos quilômetros da usina, onde nutre esperanças de um futuro melhor.
“Embora todos conheçam o acidente nuclear, poucos sabem o que está acontecendo realmente na região e os esforços em andamento para avançar”, afirma Haraguchi em entrevista. Ele acredita que a agricultura pode ser a chave para trazer novos ares à província de Fukushima e, com isso, deseja promover maior interesse nas atividades agrícolas locais. O jovem investiu na produção de kiwis como uma forma de resgatar e reestabelecer a imagem da região. “Meu objetivo é mostrar que a província é muito mais do que sua história. Queremos que as pessoas vejam a verdadeira face de Fukushima, hoje”, acrescenta.
Antes da tragédia, a província de Fukushima era reconhecida por suas abundantes plantações de frutas, como peras e pêssegos. A destruição provocada pelo desastre nuclear não só arruinou essas culturas, mas também instaurou um tabu em relação aos produtos dessa área. Contudo, após os esforços de descontaminação, que incluíram a remoção da camada superior do solo agrícola, as autoridades têm assegurado que os alimentos cultivados na área são seguros para o consumo.
No último ano, pêssegos da região foram comercializados na renomada loja Harrods, em londres, destacando a qualidade dos produtos agrícolas de Fukushima. É um sinal promissor da recuperação que a agricultura local está experimentando, com consumidores no Japão apoiando os agricultores e escolhendo seus produtos na medida em que ganham confiança. “A segurança dos nossos produtos é comprovada. Considero crucial continuar cultivando aqui”, enfatiza Haraguchi, que tem formação em engenharia de software.
Em 2021, por meio de um evento universitário, Haraguchi teve seu primeiro contato com Okuma. Na ocasião, ficou impressionado ao encontrar pessoas determinadas a revitalizar a comunidade através da agricultura do kiwi. Essa experiência foi o catalisador para ele e um parceiro fundarem o projeto “ReFruits”, que já ocupa 2,5 hectares de terras parcialmente cultivadas, com a expectativa de que a primeira colheita seja realizada no próximo ano.
O governo, por sua vez, tem incentivado a retomada da vida na área, especialmente após estabilizar os reatores da usina afetada — um processo de descomissionamento que pode levar décadas. Zonas antes consideradas proibidas em Okuma foram reclassificadas como seguras em 2019, permitindo que alguns moradores retornassem. No entanto, apenas uma fração da população original voltou, enquanto novos residentes, como Haraguchi, estão se mudando para aproveitar incentivos governamentais voltados para habitação e apoio a negócios.
Atualmente, dentre as cerca de 1.500 pessoas que habitam Okuma, mais de mil são recém-chegadas, muitas delas trabalhando na usina que ainda requer manutenção constante, além de outros setores, como agronegócio e iniciativas de tecnologia. Apesar dos esforços, os consumidores permanecem cautelosos em relação à radiação.
Em Okuma, um extenso sistema de sensores monitora regularmente os níveis de radiação. Embora algumas áreas ainda sejam consideradas inacessíveis, a propriedade de Takuya Haraguchi tem apresentado níveis de radiação ligeiramente superiores à média, mas dentro dos padrões aceitáveis aos consumidores internacionais. Análises de frutas cultivadas na região também demonstram que são seguras para consumo.
Entretanto, Kaori Suzuki, líder do grupo de ciência cidadã “Mothers’ Radiation Lab Fukushima”, alerta para os riscos persistentes que podem afetar tanto a saúde pública quanto o meio ambiente. A preocupação é válida, pois o grupo realiza testes independentes para garantir a segurança dos produtos consumidos localmente e ajudar os moradores a tomar decisões informadas.
“Nós não queremos forçar nossos produtos a um público que não se sente seguro em consumir o que produzimos. Prefiro que nossos produtos sejam valorizados por pessoas que entendam o que temos a oferecer”, conclui Haraguchi, mostrando sua determinação em construir um futuro mais promissor para Fukushima através da agricultura local e da conscientização.