A Nova Tarifa e Suas Consequências

Uma tarifa de 50% sobre produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos pode comprometer seriamente a competitividade desses bens, conforme especialistas consultados pela CNN. “Nossas exportações para os Estados Unidos são bem definidas e de extrema importância. […] Se analisarmos essa ação isoladamente, o Brasil tem muito mais a perder, especialmente nos setores que são sólidos e competitivos. É praticamente impossível competir com uma tarifa de 50% no mercado americano”, revelou Robson Gonçalves, professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Os Estados Unidos ocupam a posição de segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China. Aproximadamente 12% das exportações brasileiras, o que representa cerca de US$ 20 bilhões em 2025, são destinadas ao mercado norte-americano, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Comércio, Indústria e Serviços (Mdic).

Nos primeiros seis meses do ano, os produtos que mais se destacaram nas exportações para os EUA foram:

  • Óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos, com 12% ou US$ 2,4 bilhões;
  • Produtos semi-acabados e lingotes de ferro ou aço, com 9,7% ou US$ 1,95 bilhão;
  • Café não torrado, somando 5,8% ou US$ 1,17 bilhão;
  • Aeronaves e partes, com 5,2% ou US$ 1,044 bilhão.

Conforme Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central para Assuntos Internacionais, o setor de petróleo pode se redirecionar para outros mercados caso haja dificuldades em vender para os EUA. “Se você não vender petróleo para os Estados Unidos, há outros lugares para onde você pode enviar. No entanto, essa tarifa certamente prejudicará a indústria de manufatura do Brasil, exacerbando uma tendência negativa que já observamos na produção industrial nos últimos tempos”, destacou.

Setores em Risco

O impacto da tarifa anunciada pelo presidente Donald Trump na quarta-feira (9) deverá ser notado especialmente na siderurgia e no agronegócio. Entretanto, a indústria aeronáutica, em particular a Embraer, deve prestar atenção redobrada. “A Embraer possui um mercado significativo nos Estados Unidos, e as vendas são essenciais para a nossa balança comercial. A tarifa pode prejudicar a competitividade da Embraer em relação aos seus concorrentes”, enfatizou Gonçalves.

Por outro lado, o estrategista-chefe da RB Investimentos, Gustavo Cruz, acredita que será desafiador para os EUA substituírem a Embraer por empresas americanas. “Veremos como Trump lidará com as empresas norte-americanas, visto que a Airbus e a Boeing não têm capacidade de fornecer aviões imediatamente. Elas estão com contratos que se estendem até o final da década”, ponderou Cruz.

Além disso, a fabricante brasileira já possui operações nos EUA, o que, segundo Trump, pode ajudar a atenuar a aplicação das tarifas. Usiminas e Gerdau são outras empresas que também podem ter sua competitividade afetada.

Disrupções em Diversos Setores

O setor químico e farmacêutico, representado pela Abiquifi (Associação Brasileira da Indústria de Insumos Farmacêuticos), alertou que se a tarifa ultrapassar os 20%, muitos contratos internacionais poderão ser perdidos devido à margem que não permitiria a continuidade das exportações. Da mesma forma, o setor de tecnologia e eletrônicos tem indícios de que uma tarifa acima de 25% causaria a perda de contratos firmados nos últimos anos.

No segmento de autopeças, a situação também é preocupante, com disrupções potenciais caso as tarifas alcancem 20%. Gonçalves observa que o Brasil pode ter dificuldades em redirecionar suas exportações para diferentes mercados no contexto atual, especialmente considerando a intensa concorrência no mercado internacional, exacerbada pela produção excedente da China devido à guerra comercial iniciada por Trump.

As tensões comerciais entre Brasil e EUA podem se refletir em outros indicadores econômicos. O economista Leonardo Costa, do ASA, alerta que um agravamento do conflito pode resultar na desvalorização do real, trazendo riscos significativos de inflação para o país.

Investigação Comercial e suas Implicações

Além das tarifas, Trump anunciou uma investigação comercial contra o Brasil, conforme a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974. Essa ferramenta permite que o governo dos EUA investigue práticas comerciais desleais e barreiras ilegais, podendo levar à imposição de sanções e tarifas. “Essa investigação pode resultar em tarifas adicionais ou restrições à importação, visando um acordo que possa corrigir práticas que prejudicam o comércio”, explicou Oliver Stuenkel, pesquisador associado no Carnegie Endowment em Washington D.C.

Entretanto, Stuenkel acredita que essa ação possui mais caráter político do que legal. “Se a intenção é realmente resolver questões comerciais, essa abordagem parece mais simbólica do que prática”, concluiu.

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