Entenda a Disputa pelo IPTU nos Aeroportos
A recente operação realizada pela Prefeitura de Guarulhos, no Aeroporto Internacional de São Paulo (GRU), que visa a cobrança de uma suposta dívida bilionária em tributos, reacende um acalorado debate sobre a tributação em aeroportos e na utilização de imóveis públicos pela iniciativa privada. O episódio, ocorrido na quarta-feira (6 de agosto), envolve uma dívida estimada em R$ 2 bilhões, levantando questões sobre a legalidade e a moralidade dessa cobrança.
Em um lado desse embate, a prefeitura argumenta que a concessionária GruAirport está em débito por não ter pago o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto Sobre Serviços (ISS) nos últimos anos. Por outro lado, a GruAirport defende que a área em questão é propriedade da União e, portanto, está isenta do pagamento de impostos, um argumento respaldado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendeu a cobrança de tributos sobre imóveis da União.
Para entender melhor esta complexa situação, o Metrópoles consultou especialistas na área tributária. O tributarista Tiago Conde Teixeira, por exemplo, defende a posição da concessionária: “A afirmação da prefeitura é equivocada, pois os aeroportos estão localizados em terrenos da União. Assim, esses locais não devem pagar impostos, já que são imunes no contexto da atividade aeroportuária”, afirmou.
De acordo com Teixeira, a cobrança realizada pelo prefeito Lucas Sanches (PL) na quarta-feira (6) é uma atitude errada. “A Prefeitura não pode tomar essa decisão, visto que aquele patrimônio pertence à União e está sendo utilizado por uma empresa para prestar serviços à comunidade, especificamente os serviços aeroportuários”, acrescentou o especialista.
A Discussão em Torno do STF
A questão da incidência de IPTU sobre imóveis da União que foram concedidos à iniciativa privada para a prestação de serviços públicos está sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF) através do Recurso Extraordinário 1479.602. Este recurso, que está sob a relatoria do ministro André Mendonça, tem origem em uma ação da Ferrovia Centro-Atlântica, que contestou uma decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que permitiu a cobrança de IPTU sobre um terreno cedido para sua operação.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais argumentou que concessionárias não poderiam usufruir da imunidade tributária prevista para serviços públicos, já que têm fins lucrativos. Contudo, a concessionária contesta essa argumentação, afirmando que a natureza da empresa não altera o caráter público do bem e da atividade desempenhada. Este tema, que ainda não foi decidido pelo STF, possui repercussão geral, o que significa que a decisão influenciará casos semelhantes em todas as instâncias judiciais.
A última movimentação sobre o assunto, ocorrida em dezembro de 2024, resultou na suspensão de todos os processos administrativos e judiciais relacionados a esse tema em todo o país.
Imunidade Tributária e os Aeroportos
O advogado Pedro Dressler Pereira, especialista em direito tributário, trouxe novos elementos à discussão. Ele explica que os aeroportos são isentos de impostos devido ao conceito de imunidade recíproca, que proíbe entes federativos de se taxarem mutuamente. Isso significa que o município não pode cobrar IPTU da União. No entanto, quando esse bem é transferido para a iniciativa privada, essa imunidade é posta à prova, e é exatamente isso que está sendo debatido no STF.
“O Supremo já possui precedentes que indicam que a imunidade recíproca não se aplica a concessionárias, pois elas não são entes públicos e, portanto, não têm direito a essa imunidade tributária, mesmo quando prestam serviços públicos”, detalhou Dressler Pereira.
Em relação aos aeroportos, ele destacou que as pistas de pouso e outros serviços essenciais relacionados ao voo são de responsabilidade da União, mas outras atividades comerciais no local ocupam um espaço mais controverso. “As atividades acessórias desenvolvidas por empresas privadas nos aeroportos podem ser tributadas”, afirmou. Ele mencionou um caso anterior envolvendo o aeroporto de São Gonçalo do Amarante, onde o ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal discutiu a imunidade tributária da concessionária.
No julgamento, Barroso separou as diferentes atividades da empresa, distinguindo entre prestação de serviço público e atividades comerciais lucrativas. Este caso foi interrompido devido à pendência do julgamento sobre a repercussão geral da cobrança de IPTU.