Um estudo recente realizado por psicólogos britânicos trouxe à tona uma revelação significativa sobre a formação da percepção corporal em crianças, sugerindo que a maneira como julgamos a aparência e o tamanho do corpo é moldada muito antes do que se pensava, começando já na primeira infância. Segundo a pesquisa, que foi publicada na quarta-feira (5 de março) no Journal of Experimental Child Psychology, as opiniões sobre peso e aparência física começam a se definir em torno dos sete anos de idade.
Os pesquisadores descobriram que as crianças dessa faixa etária demonstram habilidades de julgamento comparativo em relação à aparência dos outros, similar a como os adultos fazem. Esse processo é influenciado por uma “biblioteca de corpos” que a criança cria a partir da exposição a imagens veiculadas pela mídia. Destaca-se nesse estudo que a comparação se torna ainda mais intensa quando as crianças são expostas a imagens de pessoas consideradas acima do peso, o que pode impactar negativamente a forma como percebem e valorizam diferentes corpos.
Para compreender esses mecanismos, os pesquisadores conduziram uma série de experimentos. Na primeira fase, 181 adolescentes e jovens adultos, entre 11 e 15 anos e na transição para a vida adulta, participaram de testes. Em uma segunda fase, as comparações se concentraram em crianças com idades entre 7 e 11 anos, em relação aos adultos. Os participantes foram apresentados a imagens de pessoas de diferentes pesos e foram solicitados a estimar o peso que acreditavam que essas pessoas tinham. Em seguida, foram expostas a imagens alteradas digitalmente, mostrando indivíduos com obesidade significativa ou com um corpo extremamente esquelético. Em uma terceira fase, os voluntários puderam ajustar suas estimativas iniciais com base nas novas imagens que visualizaram.
Os dados obtidos revelaram uma alteração notável nas estimativas de peso de todos os participantes. Aqueles que foram introduzidos a imagens de corpos maiores tenderam a diminuir suas estimativas de peso sobre outras fotos, o que demonstra a maleabilidade das percepções sobre o corpo. Curiosamente, a exposição a imagens de corpos considerados magros não teve o mesmo efeito em relação às percepções de magreza. Os pesquisadores argumentam que isso pode ser atribuído à prevalência quase universal de corpos esguios na mídia, que acaba por normalizar um padrão inacessível.
A pesquisa vai além ao discutir a tendência de os jovens serem “educados” a fazer avaliações de peso baseadas nas referências que recebem socialmente. Os investigadores concluíram que a influência de imagens visuais – provenientes de plataformas de mídia e publicidade – afeta tanto crianças quanto adultos de maneira similar. Segundo os especialistas, essa constante exposição a um padrão de beleza estreito e irreal contribui para a invisibilidade da diversidade corporal, o que distorce as opiniões sociais e a autoestima desde os primeiros anos de vida.
A psicóloga Lynda Boothroyd, uma das principais autoras do estudo, enfatiza a necessidade urgente de se promover representações mais diversificadas e inclusivas nos meios de comunicação. A normalização de corpos magros gera um impacto prejudicial nas percepções que tanto crianças quanto adultos constroem sobre seu próprio corpo e sobre os corpos dos outros. Boothroyd ressalta que até mesmo imagens que podem parecer neutras, quando vistas repetidamente, podem influenciar a maneira como crianças interpretam conceitos de peso e aparência.
Essas descobertas enfatizam a importância de uma intervenção precoce. O estudo destaca que o ambiente visual em que as crianças são criadas desempenha um papel crucial em seu desenvolvimento psicoemocional e nas suas expectativas em relação ao corpo humano. Portanto, é fundamental que a sociedade esteja consciente do que está sendo transmitido para as crianças e como isso pode impactar suas auto percepções e sua saúde mental.
Esse estudo da Universidade de Durham é apenas uma das várias investigações que buscam aprofundar o entendimento sobre como a percepção corporal se forma ao longo da vida e como ela influencia as atitudes individuais em diferentes faixas etárias. Pesquisas anteriores conduziram a conclusões semelhantes, revelando que a exposição excessiva a padrões corporais estabelecidos na mídia tem um efeito mais negativo em mulheres ocidentais do que em mulheres de outras culturas.
O próximo projeto da equipe de pesquisa pretende explorar como os jovens enfrentam as pressões sociais relacionadas à própria imagem corporal, buscando entender mais profundamente esse fenômeno que afeta a qualidade de vida de muitas pessoas. Com isso, espera-se promover um debate mais amplo sobre a aceitação e valorização da diversidade corporal desde a infância, contribuindo para a construção de uma sociedade mais saudável e inclusiva.