Desespero e Escassez em Gaza

Com a população faminta, hospitais à beira do colapso e um número alarmante de crianças órfãs, a situação na Faixa de Gaza se torna cada vez mais insustentável. Em entrevista à RFI, um trabalhador da ONG Ajuda Islâmica França, identificado como Riyad, descreveu a devastadora realidade enfrentada pelos civis, acentuada pela recente decisão do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, de intensificar o controle sobre a Cidade de Gaza. Essa medida, segundo ele, exacerba ainda mais o desespero da população local.

A crise humanitária na região, que já dura 22 meses, foi classificada como atingindo “níveis inimagináveis” por vários países europeus, incluindo França e Reino Unido, além de Canadá e Austrália. Riyad confirma essa visão crítica, afirmando que a escassez de alimentos, água e medicamentos se tornou crítica e que não há locais seguros para se refugiar. “Na Cidade de Gaza, quase um milhão de pessoas foram deslocadas, concentrando-se em apenas 10% a 15% do território urbano. As demais áreas estão desertas, tornaram-se ‘zonas vermelhas’ dominadas pelo Exército israelense”, contou.

Preparativos para a Fuga

Após o anúncio de Netanyahu, muitos civis começaram a buscar alternativas de abrigo, uma missão complicada em meio à superlotação. “Estamos à procura de lugares seguros, mas tudo está abarrotado de deslocados. Infelizmente, não há mais espaço. Esperamos que uma solução seja encontrada”, lamentou Riyad.

Enquanto isso, a resposta de Israel à crise parece em desacordo com as denúncias de escassez. Nesta terça-feira, o Cogat, órgão governamental israelense responsável pela administração civil na região, divulgou um relatório alegando que não existe “fome generalizada” em Gaza. Contudo, o Ministério da Saúde do enclave, sob controle do Hamas, reporta que nas últimas semanas, 227 pessoas, incluindo 103 crianças, perderam a vida devido à fome.

O Cogat, em sua análise, contesta esses dados, indicando que havia uma discrepância significativa entre os números do Hamas e os casos documentados, questionando a credibilidade das informações divulgadas. No entanto, Riyad não hesita em afirmar que “Gaza enfrenta a mais grave crise humanitária de sua história”, ressaltando que “em algumas ocasiões, passamos dois dias ou mais sem comida. Não há nada disponível”.

Desabastecimento e Preços Inflacionados

O trabalhador humanitário também destacou que, dentre os 8.400 caminhões de suprimentos que deveriam ter ingressado no território nas últimas duas semanas, apenas 112 conseguiram obter autorização de Israel. “Cerca de 90% dos caminhões que chegaram foram atacados e saqueados. Nenhum deles alcançou os estoques da Agência da ONU para Refugiados Palestinos ou do Programa Mundial de Alimentos”, afirmou.

Nos poucos mercados que ainda operam, os preços dos alimentos tornaram-se exorbitantes. “Um quilo de farinha pode custar mais de R$ 315. Não há leite para bebês, nem vitaminas, nem alimentos que possam salvar as vidas das crianças em Gaza”, lamentou.

A Luta por Medicamentos e Água

Riyad ressalta que a busca por medicamentos é ainda mais angustiante. Ele descreve a situação dos hospitais e centros de saúde como caótica, com os serviços superlotados e as equipes médicas exauridas. Além disso, a escassez de água potável força a população a esperar mais de uma hora por caminhões-tanque. “Essa é a nossa rotina diária”, acrescentou.

Pressão Internacional por um Cessar-fogo

Recentemente, o Egito anunciou esforços para estabelecer um cessar-fogo de 60 dias em colaboração com o Catar e os Estados Unidos. O ministro egípcio das Relações Exteriores afirmou que a proposta não se limita à trégua, mas também envolve a troca de reféns israelenses por prisioneiros palestinos, além de permitir o envio de ajuda humanitária e médica sem restrições.

“A população de Gaza está desesperada pela falta de ação da comunidade internacional. Precisamos de suporte real, não apenas de declarações”, afirmou Riyad. Ele defende a necessidade de uma pressão internacional efetiva para acabar com a guerra e o sofrimento, clamando: “O massacre precisa chegar ao fim”.

Com a crescente preocupação de que a situação possa piorar significativamente se Netanyahu prosseguir com a ocupação total da maior cidade do enclave, Riyad expressou seu temor: “Para onde irão as pessoas? Israel está prestes a destruir a Palestina e sua população”. Mesmo diante dessa devastação, ele revela que sua única escolha é seguir em frente. “Estou destruído por dentro, mas tenho que ser forte por minha família. Lutamos diariamente contra a dor e a morte. É uma batalha pela vida.”

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