Impacto das Tarifas Unilaterais e a Reação do Brasil

Durante uma reunião na Organização Mundial do Comércio (OMC), o Brasil expressou suas preocupações sobre as políticas comerciais do governo de Donald Trump, descrevendo-as como um “ataque sem precedentes” ao sistema multilateral de comércio. A imposição de tarifas unilaterais e arbitrárias contra diversas nações está em desacordo com os princípios fundamentais que regem a OMC. Segundo o governo brasileiro, essas medidas não apenas infringem as regras acordadas, mas também têm o potencial de desencadear uma “espiral de preços altos e estagnação” econômica em escala global.

“Essas medidas unilaterais representam uma violação clara dos princípios que sustentam a OMC, essenciais para o comércio internacional”, afirmou Philip Fox-Drummond Gough, embaixador e secretário de assuntos econômicos e comerciais do Itamaraty, durante sua intervenção no Conselho Geral da OMC. O cenário atual se agrava quando consideramos que desde a reeleição de Trump em 2025, os EUA têm adotado uma postura cada vez mais isolacionista em relação ao comércio internacional.

Tarifas Altas: Impactos no Brasil e Outros Países

Em um curto período de seis meses, o presidente Trump anunciou tarifas sobre quase todos os seus parceiros comerciais. As novas tarifas que começam a valer em 6 de agosto afetarão em particular o Brasil, com taxas que podem chegar a 50% sobre diversas exportações. Já o Canadá, por exemplo, está sob uma taxa que já entrou em vigor desde 1º de agosto. No que se refere à China, uma tarifa básica de 30% entrará em vigor em 12 de agosto, resultado de negociações diretas com o governo americano.

Mas será que tais ações realmente violam as normas da OMC? Para esclarecer essa questão, a BBC News Brasil consultou especialistas da área. David Collins, professor de Direito Econômico Internacional na City St. George’s, University of London, acredita que o mundo pode estar enfrentando uma nova fase nas relações comerciais globais, marcada pela perda da influência de instituições internacionais e crescente desrespeito às regras que foram estabelecidas após a Segunda Guerra Mundial.

A Visão dos Especialistas sobre as Ações de Trump

Apesar das políticas de Trump, Kathleen Claussen, da Universidade Georgetown, defende que a maior parte dos países ainda valoriza as regras do sistema internacional de comércio e não está disposta a abandoná-las. Contudo, ambos os especialistas concordam que o governo americano tem, de fato, desrespeitado as normas que garantem a concorrência justa no comércio.

“A maioria dos juristas em comércio internacional considera que as ações do governo Trump contrariam as regras da OMC“, diz Claussen. A advogada, que esteve presente em audiências sobre leis tarifárias nos EUA e na Europa, destaca a violação de diversas normas, tanto na aplicação de taxas diferenciadas para diferentes países quanto na celebração de acordos bilaterais.

A Justificativa para as Tarifas e as Respostas do Governo Trump

Trump tem justificado suas tarifas com argumentos relacionados à segurança nacional. Recentemente, anunciou tarifas sobre importações do Canadá, México e China, afirmando que essas medidas são necessárias para combater ameaças como a imigração ilegal e o tráfico de drogas. Em abril, o presidente também apresentou uma tarifa de 10% sobre todas as importações, alegando que essa ação busca igualar as taxas aplicadas por outros países aos produtos americanos. Desde então, a Casa Branca tem se comunicado com nações afetadas, informando sobre as tarifas especiais.

Os Princípios da OMC e as Ações dos EUA

A OMC, que conta com 166 membros e foi criada em 1995, estabelece princípios fundamentais como não-discriminação e tratamento especial para países em desenvolvimento. O artigo II do GATT, que regula as tarifas, stipula que os países devem cumprir com os compromissos tarifários previamente acordados. As tarifas impostas por Trump, segundo Collins, vão contra essas obrigações, que buscam garantir previsibilidade e estabilidade no comércio internacional.

As ações de Trump também foram vistas como uma violação dos acordos bilaterais e multilaterais, como o USMCA, do qual tanto o México quanto o Canadá alegaram violação por parte dos EUA. Além disso, a aplicação de tarifas diferenciadas para diferentes nações contraria o princípio da Nação Mais Favorecida, estabelecido pela OMC.

A Indefinição do Futuro do Comércio Internacional

Frente a esse cenário, os países afetados têm a opção de apresentar queixas à OMC. Contudo, desde 2019, a capacidade de resolução de disputas da organização está comprometida devido ao impasse na nomeação de novos membros para o Órgão de Apelação. Isso significa que a OMC pode ser incapaz de dar seguimento a queixas de violação, enfraquecendo sua própria eficácia.

Trump, por sua vez, defende suas ações alegando que os EUA foram historicamente prejudicados por práticas comerciais injustas. A imposição de tarifas seria uma maneira de corrigir essa desigualdade e gerar receita para o governo americano.

O que tudo isso significa para o futuro do sistema comercial global? Para Collins, o enfraquecimento das normas estabelecidas após a Segunda Guerra Mundial é evidente e a tendência é a criação de acordos bilaterais em detrimento do multilateralismo. Já Claussen se mantém esperançosa, acreditando que a maioria dos países ainda valoriza as regras e fará esforços para preservá-las, apesar da ausência dos EUA.

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