Coragem em meio ao pânico

Na última quarta-feira (9/7), uma cena de horror se desenrolou na Asa Norte, em Brasília, quando duas mulheres se depararam com uma abordagem policial violenta envolvendo o publicitário Diego Torres Machado de Campos, de 42 anos. Descrevendo a situação como um verdadeiro “terror”, elas acolheram o filho de Diego, o pequeno Tito, de apenas 5 anos, que ficou abandonado no local após a prisão de seu pai, sem que os policiais da Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA) prestassem qualquer assistência à criança.

As duas testemunhas, que preferem manter suas identidades em anonimato por temerem retaliações, compartilharam seus relatos com o Metrópoles. Ambas estão lidando com as consequências emocionais do que viram e afirmam que desde o incidente nenhuma autoridade se aproximou delas, deixando-as com uma sensação de abandono e insegurança.

“Foi uma cena de horror. A primeira impressão que tive era que se tratava de um fugitivo sendo perseguido. Mas ao perceber que havia uma criança no carro, fui em direção à situação. O rapaz estava desesperado, pedindo ajuda. Pensei que, quanto mais pessoas estivessem presentes, mais os policiais agiriam corretamente,” comentou uma das testemunhas.

Cena de pânico

A abordagem ocorreu na quadra 112 Norte e foi gravada por testemunhas, com vídeos que rapidamente se espalharam nas redes sociais. Nas imagens, é possível ver Diego imobilizado no chão, enquanto um policial civil o contém com o joelho em suas costas. Tito, que estava no banco de trás, assistia à cena, chorando.

De acordo com os relatos, as viaturas envolvidas não estavam identificadas, e os policiais não apresentaram suas credenciais no início da abordagem. A versão oficial da Polícia Civil alega que Diego teria colidido seu veículo com uma viatura descaracterizada, o que teria justificado sua detenção.

“A imagem do Tito chorando desesperadamente não sai da minha cabeça. Aquilo se tornou um pesadelo. Todos os dias depois do ocorrido, revivo a cena. O pai estava em pânico, gritando: ‘meu filho!’. Ele parecia muito mais preocupado com o bem-estar de Tito do que com sua própria segurança,” relatou uma das mulheres. Ela acrescentou que é imprescindível que protocolos adequados sejam estabelecidos para situações como essa: “A viatura não estava identificada, e os policiais também não. Isso não pode acontecer em lugar algum.”

Criança ferida e sem acolhimento

Uma das mulheres relatou ainda que o menino ficou com uma perna ferida ao tentar sair do carro durante a abordagem. “Fecharam a porta do carro nele. Mais tarde, percebi que suas perninhas estavam machucadas. Foi muito doloroso. Ninguém se preocupou com o que ele estava sentindo,” desabafou.

Mesmo diante das solicitações de um tratamento adequado para a criança, a resposta dos policiais foi omissa. “Eu perguntei várias vezes ao policial: ‘Qual é o procedimento para a criança?’. Ele apenas apontou a arma para mim e me empurrou. Ele poderia ter pedido para que eu ficasse com a criança, anotasse um telefone, mas não fez absolutamente nada,” contou uma das mulheres.

“Foi tudo muito instintivo. Eu dei água para ele e tentei acalmá-lo. Ele estava muito agitado, dizia seu nome completo e a data de aniversário. Dava muita pena ver o desespero dele,” lembrou.

Intimidação e medo

As testemunhas também relataram que, ao tentarem questionar as ações dos policiais, acabaram sendo ameaçadas. “Quando questionei por que estavam levando o pai daquela forma, um deles me disse: ‘Você está presa’. Eu respondi: ‘Não fiz nada de errado, sou jornalista’. Fiquei com muito medo. Eles me perguntaram se eu gostaria de ensinar como a polícia funciona,” disse uma das mulheres.

“Após o ocorrido, ninguém nos procurou. Estou com medo, principalmente porque esse secretário de Segurança Pública já teve atitudes preocupantes no passado. Como produtora cultural, isso me afeta diretamente. Estou realmente assustada,” desabafou.

Ministério Público investiga

A Ouvidoria do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) tomou providências e encaminhou o caso ao Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial (Ncap), que pode abrir um procedimento para investigar a conduta dos policiais civis da DCA. O órgão já recebeu os vídeos do incidente e relatos das testemunhas.

“Fico aliviada em saber que as entidades estão tomando medidas. Se não fosse por elas, esse caso poderia ser ignorado,” comentou uma das mulheres.

A mãe de Tito, a colunista do Metrópoles Gabriella Furquim, também denunciou que seu filho foi deixado nas mãos de estranhos em meio ao caos, enquanto os policiais conduziam Diego à delegacia. “Quando cheguei, ele estava chorando, no colo de uma mulher desconhecida. Me disseram que o pai havia sido espancado e arrancado do carro,” relatou à reportagem.

Justiça e reparação

As duas mulheres afirmaram que não se calarão, apesar do medo que sentem. Ambas continuam sem dormir devidamente desde o dia do incidente. “Não temos suporte. Estou há dois dias sem conseguir dormir. No entanto, meu desejo por justiça ainda é mais forte,” concluíram.

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