O avanço da saúde digital no Brasil destaca-se como uma das tendências mais promissoras do futuro do setor, especialmente com a popularização da telemedicina e a integração eficiente de dados. Embora o país enfrente desafios significativos como a falta de infraestrutura, problemas de conectividade e a necessidade de capacitação profissional, iniciativas como o Programa SUS Digital demonstram a busca crescente pela democratização do acesso à saúde. Um exemplo recente desse movimento é a inauguração, no dia 19 de agosto, do maior projeto de saúde digital do Estado de São Paulo, acompanhado pela ativação do Centro de Inovação em Saúde Digital no Instituto Perdizes do Hospital das Clínicas. Este centro tem a missão de ampliar o acesso ao teleatendimento, aumentar a oferta de serviços de saúde, acelerar diagnósticos e aprimorar a eficácia da rede de saúde pública.
Com a disponibilização de 98 estações de teleatendimento e um painel de monitoramento que auxilia na tomada de decisões, o programa prevê um investimento significativo de R$ 166 milhões. A coordenadora de Saúde Digital da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, Cristina Balestrin, observa que a situação da saúde digital no estado é bastante diversa, variando significativamente entre regiões. Enquanto a capital paulista se destaca em termos de serviços, o Vale do Ribeira, por exemplo, enfrenta enormes obstáculos em termos de conectividade e infraestrutura. Portanto, é fundamental encarar a saúde digital não como uma solução mágica, mas como uma ferramenta essencial para melhorar a oferta de serviços, incrementar a qualidade do atendimento e reduzir desperdícios.
Cristina Balestrin explica que a estratégia para a transformação digital é fundamentada em cinco pilares principais: iniciativas estruturantes e definições estratégicas; fortalecimento da atenção básica; acesso a serviços assistenciais especializados; reestruturação da oferta de serviços de saúde; e otimização da assistência farmacêutica. O diagnóstico inicial do programa envolveu uma análise abrangente do cenário existente, seguido de um levantamento das iniciativas em telemedicina e saúde que já estavam em andamento, muitas delas criadas durante a pandemia. Esse mapeamento permitiu entender a realidade do setor no Brasil, em especial em São Paulo, onde o Conselho Municipal de Secretários de Saúde (COSEMS/SP) se destacou ao constituir um grupo de trabalho dedicado à saúde digital. Essa iniciativa foi o pontapé inicial para uma colaboração mais próxima com o Ministério da Saúde e culminou na realização do primeiro Simpósio Nacional de Transformação Digital no SUS.
Entender as necessidades da população se tornou uma prioridade ao desenvolver serviços assistenciais. Parcerias estratégicas com instituições como o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo foram fundamentais nessa jornada. No final de dezembro, um convênio foi assinado para lançar o Programa de Desenvolvimento e Inovação (PDI) voltado para a saúde digital, englobando não apenas iniciativas estruturais, mas também capacitação e avaliação da maturidade digital das instituições de saúde. O centro de inovação criado funcionará como um hub de treinamento, serviços e monitoramento, com suas ofertas assistenciais já definidas no momento da formalização. Em março, o Ministério da Saúde publicou a portaria que oficializou o programa SUS Digital, assegurando a alinhamento total com as iniciativas em progresso.
Atualmente, a capacitação é uma prioridade, sendo realizada de forma síncrona e assíncrona, inicialmente focada na cultura digital em saúde. Contudo, essa formação deverá ser contínua. A coordenadora ressalta que muitos municípios, mesmo na atenção básica, acabam terceirizando serviços a organizações sociais, mas, com a conclusão dos contratos de gestão, frequentemente essas iniciativas se perdem. A situação exige que as informações e recursos cheguem efetivamente aos pontos mais necessitados da assistência.
Um dos desafios mais significativos consiste em estruturar a transformação digital para que tenha um impacto duradouro. A coordenadora enfatiza a importância de que as pessoas compreendam o conceito de saúde digital, reconhecendo que não é a solução para todos os problemas, mas sim uma ferramenta que precisa ser utilizada de forma consciente para promover decisões informadas. Não deve se restringir a um simples projeto ou a uma oferta de serviço isolado, e é crucial que não acentue ainda mais as desigualdades existentes no acesso à saúde.
A saúde digital também pode trazer soluções para a falta de transparência nas filas de espera. Um levantamento recente indicou que em São Paulo cerca de 445 mil pessoas esperam por exames na rede pública municipal, representando um aumento de 52,4% em relação ao ano anterior. O exame de endoscopia é o mais requisitado. Balestrin explica que, para melhorar a transparência sobre as filas, é necessário transformar dados em informações estruturadas, um processo que precisa ser feito gradativamente. Além disso, ela enfatiza a necessidade de discutir estratégias para a regulação das ofertas de saúde, pois a ordem de chegada em filas nem sempre é o melhor critério.
Com relação a outras áreas, estão sendo realizadas testes em ofertas de serviços para atenção básica e especializada, além de alta complexidade, em municípios selecionados para validar o modelo. Acompanhar indicadores críticos, como controle de hipertensão e pré-natal, por meio de painéis de desempenho, permitirá intervenções mais rápidas e eficazes no atendimento à saúde. A participação de médicos especialistas será fundamental para apoiar profissionais em formação, reforçando a importância da capacitação contínua na utilização de prontuários eletrônicos.
A coordenadora finaliza destacando que o Estado precisa acompanhar a prestação de serviços, definindo requisitos e critérios de qualidade. O PDI visa estabelecer parcerias e ampliar a oferta, levando em consideração a necessidade de monitoramento e validação antes de uma expansão mais ampla das iniciativas de saúde digital.