Entenda o Conflito Comercial entre Brasil e EUA
Lançado em 2020 pelo Banco Central do Brasil, o Pix transformou radicalmente a forma como os brasileiros realizam pagamentos e transferências. Com seu modelo gratuito, instantâneo e gerido por uma instituição pública, o sistema ganhou rapidamente a preferência da população, contando atualmente com mais de 160 milhões de usuários. Entretanto, esse sucesso trouxe à tona uma disputa internacional que envolve questões econômicas e geopolíticas.
Em julho de 2025, o governo dos Estados Unidos, através do Escritório do Representante Comercial (USTR), deu início a uma investigação comercial que inclui o Pix entre os alvos de suas preocupações.
Motivações da investigação: O Que os EUA Alegam?
A investigação norte-americana, fundamentada na Seção 301 da Lei Comercial dos EUA, histórica por abordar práticas consideradas desleais, destaca que o Pix estaria criando uma barreira desleal à concorrência. Segundo o embaixador Jamieson Greer, a gratuidade do sistema prejudica empresas privadas, incluindo as norte-americanas, que oferecem serviços de pagamentos. A denúncia argumenta que, ao não cobrar taxas, o Pix gera uma “vantagem injusta”, visto que as empresas privadas precisam implementar tarifas para garantir a lucratividade.
Além do Pix, a investigação inclui outros pontos de tensão, como a pirataria na famosa Rua 25 de Março, em São Paulo, disputas legais entre o governo brasileiro e plataformas digitais dos EUA, e a suposta falta de proteção à propriedade intelectual no Brasil.
Especialistas Rebatem as Alegações
Profissionais de direito internacional e comércio exterior têm se manifestado contra as alegações dos EUA. O advogado Aurélio Marchini defende que o Pix é uma infraestrutura pública sem fins lucrativos e que está disponível para qualquer instituição financeira que seja autorizada pelo Banco Central. “Não existe exclusividade ou limitações. Qualquer fintech ou banco, seja brasileiro ou estrangeiro, pode utilizar o Pix, desde que cumpra as normas estabelecidas”, diz Marchini.
Por outro lado, economistas como Renata Nemer e Fabrizio Velloni enfatizam que as ações dos Estados Unidos são motivadas mais por questões políticas do que por preocupações legais. Eles apontam que a irritação dos EUA se dá pelo fortalecimento das relações do Brasil com os BRICS e a China, além do movimento pela independência financeira da América Latina.
O Futuro do Pix: Sem Riscos de Encerramento
Apesar da retórica alarmante vinda de Washington, as chances de o Pix ser descontinuado são praticamente nulas. “O Pix é uma política interna, sob a gestão de uma entidade autônoma. Os EUA não possuem jurisdição para encerrá-lo”, afirma Marchini.
Ainda que os EUA não possam interromper diretamente o funcionamento do Pix, eles poderiam aplicar medidas de retaliação econômica, como tarifas de importação sobre produtos brasileiros ou restrições para empresas do Brasil que desejem exportar para o mercado norte-americano. Contudo, tais ações exigiriam tempo e poderiam ser questionadas em organismos como a Organização Mundial do Comércio (OMC).
Respostas do Brasil e o Papel do Governo
Em resposta à pressão dos EUA, o governo brasileiro adotou uma postura decidida. De acordo com informações da Folha de S.Paulo, o Palácio do Planalto já iniciou a elaboração de um parecer técnico que contrarresta as alegações apresentadas como “barreira comercial”. Além disso, uma campanha nacional com o slogan “O Pix é nosso” foi lançada, enfatizando o caráter acessível e democrático do sistema, amplamente utilizado por milhões.
Até o momento, o Banco Central do Brasil não se manifestou oficialmente sobre a investigação, embora fontes internas indiquem que o órgão está atento à situação e prepara documentação para se proteger, se necessário.
Contexto Internacional: A Luta por Sistemas de Pagamento Públicos
A abordagem dos EUA contra o Pix não é um fenômeno inédito. Em ocasiões passadas, sistemas de pagamento estatais de países em desenvolvimento também foram alvos de críticas e investigações semelhantes. Essa postura retrata uma estratégia protecionista, com o intuito de proteger empresas privadas americanas da concorrência de modelos gratuitos e estatais de outras nações.
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O Impacto do Pix na Inclusão Financeira Brasileira
O Pix foi projetado para diminuir a dependência de cartões de crédito e boletos, ao mesmo tempo em que promove a inclusão financeira. Hoje, milhões de brasileiros utilizam a plataforma para receber salários, pagar contas e administrar pequenos negócios. Renata Nemer destaca o sucesso do Pix como uma política pública que substituiu modelos antigos, sendo acessível até àqueles que nunca tiveram conta em banco tradicional.
Ademais, a pressão dos EUA reacende um importante debate sobre a soberania digital e sobre a urgência de países em desenvolvimento investirem em suas próprias infraestruturas tecnológicas, sem depender de conglomerados internacionais. Com o fortalecimento do BRICS e o surgimento do Novo Banco dos BRICS (NDB), há um crescente impulso por plataformas de pagamentos multilaterais que possam competir com o dólar e sistemas como Visa e Mastercard.
Conclusão: Uma Tempestade em Copo d’Água?
A investigação dos EUA contra o Pix deve ser analisada no contexto de pressões geopolíticas e interesses econômicos dos EUA. Embora não haja uma ameaça imediata para os usuários brasileiros, essa movimentação serve como um alerta sobre a autonomia digital do Brasil e sua posição no cenário econômico global. O Pix, por enquanto, continua a operar normalmente, reafirmando-se como um modelo de inovação reconhecido internacionalmente.