O Livro e a Experiência Pessoal de Jamil Chade
Nos primeiros meses do governo Donald Trump, especificamente em abril, o Departamento de Segurança Interna reportou a deportação de mais de 142 mil imigrantes irregulares. Essa situação alarmante não se restringe apenas àqueles que estão sem documentos, mas também se transforma em uma ferramenta política utilizada para perseguir críticos e opositores do governo.
No novo livro do jornalista Jamil Chade, intitulado “Tomara que você seja deportado: uma viagem pela distopia americana“, o autor narra sua experiência pessoal e profissional nos Estados Unidos, especialmente em relação ao endurecimento das políticas de imigração. Durante a nova edição do Pauta Pública, Chade reflete sobre as implicações dessas políticas para a sociedade.
O título do livro surgiu de uma situação vivida por seu filho, que escutou a frase “Tomara que você seja deportado” de outra criança na escola. Para Chade, isso ilustra como a desinformação e o ódio permeiam as relações sociais, afetando até aqueles com situação migratória regular: “Todo mundo, no fundo, foi afetado”, afirma ele.
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A Crítica à Política Anti-imigração de Trump
Chade defende que as políticas anti-imigração instauradas por Trump são parte de um plano organizado pela extrema direita. “Eles têm planos, muito dinheiro e um objetivo ambicioso de refundar as regras da sociedade. É muito sério o que está acontecendo para a gente tratar como meme”, alerta o autor. A conversa revela como as políticas de imigração são mais complexas do que aparentam, sendo conectadas a um discurso global em ascensão, que culpabiliza imigrantes por crises sociais e econômicas.
O jornalista também menciona sua experiência ao visitar a fronteira entre os Estados Unidos e o México, onde observou como barreiras não físicas estão sendo erguidas em todo o país. “Esse muro está sendo construído em todas as partes dos Estados Unidos, com retórica, tecnologia e com a identificação do outro como uma ameaça”, explica Chade.
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O Crescimento da Desumanização e a Resistência
Chade discute a crescente desumanização dos imigrantes, uma estratégia que facilita a perseguição e a violência contra esses grupos. Essa retórica, segundo ele, é alimentada pelo movimento MAGA (Make America Great Again) e se reflete em ações cruéis, como prisões em tribunais, hospitais e até mesmo em igrejas. “É uma estratégia de instaurar o terror na sociedade”, diz Chade, ressaltando como isso impacta até aqueles que possuem visto.
Sobre a resistência, Chade relata que os movimentos nos Estados Unidos estão em fase de organização, com um foco significativo em medidas legais e na defesa da democracia. “Ainda não vi uma mobilização social forte, o que é surpreendente, considerando a gravidade da situação”, afirma. Para ele, a resistência está sendo construída de forma lenta, mas com uma consciência crescente sobre a importância das instituições e do papel de cada um na proteção da democracia.
Reflexões sobre o Futuro das Democracias
Walter Salles, que escreveu o prefácio do livro, enfatiza que a obra é um alerta sobre os riscos que as democracias enfrentam. Chade concorda, apontando que as instituições não são autosustentáveis; elas dependem do compromisso das pessoas que nelas atuam. “Quando as instituições são capturadas por aqueles que desejam desmantelar a democracia, o que resta é a ação individual para proteger o que foi conquistado”, esclarece o autor.
Ele conclui afirmando que a experiência dos Estados Unidos deve servir de alerta para outras democracias, incluindo o Brasil. “O medo que precisamos ter é que essa exportação do autoritarismo se torne uma realidade em outros países, e isso pode acontecer com a eficiência de um movimento político aliado a um poder econômico desmedido”, finaliza. A conversa com Jamil Chade revela não apenas a profundidade das questões imigratórias atuais, mas também provoca reflexões essenciais sobre o futuro da democracia global.