Ao contrário do que muitos pensam, a mpox – a nova denominação da doença anteriormente conhecida como varíola dos macacos – continua a circular no brasil, mesmo após o surto global que ocorreu em 2022. Segundo os dados mais recentes do Ministério da Saúde, até o dia 10 de setembro, foram registrados mais de 1 mil casos confirmados ou prováveis da infecção. Embora esse número represente uma queda considerável em relação aos 10 mil casos registrados no auge do surto dois anos atrás, o alerta persiste. Em 24 de agosto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou uma nova emergência de saúde pública devido ao recente ressurgimento da mpox.
### Entenda a doença mpox e as mudanças desde 2022
#### Origem e causas do novo surto da mpox
O vírus da mpox é endêmico em regiões específicas da África Central, abrangendo países como Camarões, Nigéria e República Centro-Africana. Neste contexto, existem duas variantes que têm circulado por décadas: clado 1 e clado 2. O clado 1, predominante na Bacia do Congo, é associado a formas mais severas da doença, enquanto o clado 2 geralmente resulta em quadros mais leves. Esta variante clado 2, que causou o surto de 2022, ainda é responsável por casos no brasil.
Curiosamente, o clado 1 havia apresentado surtos restritos a determinadas comunidades africanas. No entanto, desde setembro de 2022, especialistas, como a infectologista Emy Akiyama Gouveia, observam que essa variante parece ter desenvolvido uma capacidade de transmissão prolongada, afetando grupos que anteriormente eram menos impactados, incluindo as crianças.
#### Início do novo surto
A elevação recente dos casos de mpox começou na República Democrática do Congo (RDC), possivelmente ligada a um surto na região de Kivu, que enfrenta conflitos e uma crise humanitária. Amostras coletadas no final de 2023 revelaram uma nova variante do clado 1, nomeada clado 1b, que mostra um padrão de transmissão mais eficiente por meios que vão além do contato sexual — a principal via de contágio do clado 2. Essa nova cepa tem migrado de áreas rurais para regiões urbanas, aumentando o potencial de disseminação.
#### Diferenças entre o surto atual e o de 2022
Enquanto dois anos atrás a disseminação do clado 2 foi especialmente notável entre homens que se relacionam sexualmente com outros homens, fazendo com que a doença se espalhasse rapidamente por mais de 100 países, incluindo o brasil e partes da europa e da Ásia, o atual surto está gerando diferentes preocupações. A cepa 1b está se espalhando com rapidez e afetando também pediatria em um número significativo. A razão por trás deste aumento de casos infantis ainda não está totalmente clara, mas reflete a complexidade do cenário atual.
#### Declaração de Emergência pela OMS
A OMS emitiu um alerta após observar um aumento significativo nos casos. Somente neste ano, a RDC contabilizou mais de 15 mil casos registrados de mpox, resultando em mais de 500 mortes. Em uma única semana de agosto, 2.400 casos suspeitos foram relatados, com 56 óbitos. Para efeito de comparação, em 2022, os surtos impactaram mais de 100 países, resultando em quase 100 mil diagnósticos e cerca de 200 fatalidades.
A doença também se espalhou para nações vizinhas da RDC, como Burundi, Quênia, Ruanda e Uganda, que até então não haviam registrado casos. O risco de uma disseminação mais ampla pelo continente africano e além é uma preocupação crescente. Gouveia ressalta que esse avanço rápido da mpox pode se transformar em uma crise ainda maior se não forem tomadas medidas adequadas.
Em resposta a este cenário alarmante, a OMS lançou um plano global que visa intensificar as vigilâncias, promover estratégias de prevenção e resposta, e facilitar o acesso a testes e vacinas. Também inclui ações destinadas a reduzir a transmissão zoonótica, além de trabalhar em colaboração com as comunidades para promover a conscientização e o controle da doença.
#### Mecanismos de transmissão da mpox
A mpox é classificada como uma zoonose, transmitida por animais, especialmente por roedores. O termo “varíola dos macacos” surgiu após primatas apresentarem lesões que se assemelhavam às da varíola humana em um laboratório na Dinamarca em 1958. O primeiro caso humano foi registrado em 1970, na República Democrática do Congo. A doença é resultante de um vírus semelhante ao da varíola, que já causou epidemias devastadoras, mas foi erradicado pela vacinação.
As lesões características da mpox surgem na pele, resultando em bolhas que formam crostas que eventualmente caem. Apesar de ser uma zoonose, a mpox também pode ser transmitida entre pessoas, principalmente pelo contato direto com as lesões. O contágio pode ocorrer durante atos sexuais, por vias respiratórias através de gotículas e pelo compartilhamento de itens pessoais, como roupas de cama. A pessoa afetada permanece transmissível até que todas as lesões cicatrizem completamente, o que pode levar até 21 dias.
#### Tratamentos disponíveis e vacinação
Embora a doença possa ser auto-limitada, é importante destacar que algumas infecções podem levar a complicações, como infecções secundárias, que podem ser fatais. Atualmente, o tratamento é direcionado ao alívio dos sintomas, e um antiviral, o tecovirimat, tem sido utilizado, mas sua eficácia contra o clado 1 ainda é questionável.
Quanto à vacinação, a disponibilidade das doses é extremamente limitada globalmente devido a desafios de produção. A OMS não recomenda a vacinação em massa, focando seus esforços em indivíduos de alto risco, como aqueles que entram em contato com casos confirmados ou profissionais de saúde. Até agora, em 2023, o brasil vacinou quase 50 mil pessoas consideradas vulneráveis e continua em negociações para garantir mais doses, levando em consideração a escassez e a eficácia contra a variante em circulação.
Por fim, o Ministério da Saúde do brasil está intensificando suas estratégias de vigilância, tendo estabelecido um Centro de Operações de Emergência em Saúde (COE) em agosto, que se reúne diariamente para monitorar casos e coordenar respostas eficazes à mpox. A prioridade agora é garantir que as respostas sejam rápidas e adequadas, alinhadas com recomendações globais, a fim de proteger a saúde pública e interromper a transmissão da doença.