Análise da UFRJ Mapeia Conexões entre Grupos Antagônicos e Mobilizações Golpistas
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) conduziu um estudo revelador, destacando como diversas comunidades nas redes sociais se uniram para apoiar as mobilizações golpistas que culminaram nos ataques à Praça dos Três Poderes no Distrito Federal em 8 de janeiro. A pesquisa examinou mais de 500 mil mensagens provenientes de 205 grupos públicos no Telegram, abrangendo o período de 30 de outubro de 2022 até 9 de janeiro de 2023.
Os dados apontam que grupos inicialmente voltados para temas distintos, como antivacinas, oposição à ideologia de gênero e terraplanismo, convergiram para um suporte conjunto ao ideário bolsonarista. Camilla Machuy, a doutora que liderou a pesquisa, observou a formação de “células coordenadas”, utilizando uma linguagem militarizada e instruções práticas.
“Esses grupos funcionaram como câmaras replicadoras de mensagens pró-Bolsonaro, enviando ordens diretas sobre o que vestir, onde se encontrar e como evitar a polícia”, explicou Machuy. A pesquisa revela que o Telegram atuou como uma plataforma fundamental para a ação política, onde grupos de teorias da conspiração foram ativados em momentos estratégicos.
Articulações entre Diversas Comunidades
Além das mencionadas, o estudo também constatou uma união entre comunidades anti-LGBTQIA+, defensores da ditadura militar, revisionistas históricos e canais associados a figuras como Olavo de Carvalho e políticos bolsonaristas. Assim, esses grupos se combinaram para planejar os ataques de 8 de janeiro.
A pesquisa identificou picos de mobilização digital em momentos-chave, como a derrota de Bolsonaro no segundo turno das eleições, em 30 de outubro de 2022, e a posse do presidente Lula, em 1º de janeiro de 2023. Em cada um desses eventos, a quantidade de mensagens contendo expressões como “intervenção militar”, “forças armadas” e “ir a Brasília” aumentou consideravelmente. “Isso mostra como o ambiente digital foi instrumentalizado para articular ações e preparar os seguidores”, comentou a pesquisadora.
Surpreendentemente, em comunidades antivacinas, os termos comuns da pauta sanitária foram substituídos por expressões ligadas à mobilização golpista, como “três poderes” e “intervenção militar”. “Os dados evidenciam que grupos com pautas distintas se alinharam em um discurso coeso, atuando como células interconectadas através do Telegram”, destacou Camilla.
Estrutura Logística e Continuidade das Mobilizações
O estudo também revelou a existência de uma organização logística dentro do Telegram, utilizada para coordenar a movimentação de manifestantes de várias partes do país em direção a Brasília. As comunidades compartilharam rotas de caravanas, listas de contatos, links para cadastramento via WhatsApp e convites diretos à mobilização golpista.
A pesquisa utilizou avançadas ferramentas de análise de dados e processamento de linguagem natural em Python, empregando filtros para identificar mensagens mais compartilhadas e mapear a evolução do discurso até os ataques. As conclusões do estudo não apenas elucidam como a desinformação se espalha nas redes sociais, mas também levantam questões importantes sobre o papel das plataformas na moderação de conteúdos potencialmente perigosos.