A Evolução das Milícias no Rio de Janeiro

No contexto carioca, as milícias emergem como um fenômeno complexo, que vai além das facções criminosas. Elas se estabelecem em áreas estratégicas, buscando dominar e explorar regiões inteiras. Apesar de frequentemente serem associadas ao crime militar, a compreensão do seu funcionamento é ainda um desafio, especialmente para aqueles que não estão familiarizados com o tema.

Recentemente, a coluna teve a oportunidade de conversar com José Cláudio Sousa Alves, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Há mais de três décadas, Alves investiga a dinâmica das milícias no Brasil, trazendo uma visão aprofundada sobre a questão.

A História das Milícias no Brasil

Para entender a origem das milícias, é essencial olhar para o passado. Alves explica que a gênese desse fenômeno remonta à época da ditadura militar no Brasil, onde surgiram como grupos de extermínio ligados à segurança pública. Em 1964, esses grupos eram financiados para atuar em uma espécie de “limpeza social”, especialmente na Baixada Fluminense, que já era densamente povoada na época. “Os grupos contavam com recursos de empresários para eliminar opositores, enquanto o Estado garantia a impunidade”, esclarece o professor.

No decorrer da década de 1980, a terceirização das operações de extermínio se intensificou. “Estruturas de segurança pública passaram a repassar as responsabilidades a civis, que formavam seus próprios grupos, reduzindo assim a exposição e o envolvimento direto do Estado”, detalha Alves.

Por volta dos anos 1990, os primeiros indícios das milícias como as conhecemos hoje começaram a surgir. “Os integrantes desses grupos começaram a se eleger para cargos políticos, transformando a execução sumária em um fenômeno com repercussão política”, comenta.

Componentes da Estrutura Miliciana

Alves lista cinco elementos essenciais que sustentam a continuidade das milícias:

  1. Presença de servidores públicos, com destaque para a atuação de policiais.
  2. Profissionais com habilidades específicas para causar danos à população, muitas vezes treinados em operações de segurança.
  3. Controle territorial, com uma abordagem militarizada das áreas dominadas.
  4. Financiamento por parte de empresários e comerciantes, que se tornam parte integrante da estrutura miliciana.
  5. Trajetórias políticas exitosas, onde membros das milícias buscam ascensão em projetos eleitorais.

Esses fatores consolidam as milícias como uma entidade de continuidade, cada vez mais integrada ao tecido social e político.

Transformações e Novos Negócios

Alves observa que, nesta nova fase, as milícias ampliaram seu campo de atuação: “Hoje, não se limitam ao assassinato e extorsão, mas também ao comércio de bens e serviços.” A venda clandestina de combustíveis e o controle de serviços essenciais se tornaram fontes significativas de lucro para esses grupos, consolidando seu domínio na sociedade.

A estrutura miliciana se desenvolve desde o início dos anos 2000, à medida que os conflitos com facções criminosas moldam suas estratégias de operação. “As alianças e rivalidades entre grupos armados impactam diretamente na evolução dessas organizações”, explica.

Um Poder Inabalável

O crescimento contínuo das milícias é uma realidade. Alves destaca que, ao longo do tempo, elas passaram a conquistar a confiança da população, eliminando a necessidade de coerção direta. “O apoio popular é agora uma questão de escolha, onde muitos veem vantagens em apoiar essas organizações”, conclui.

Em suma, o fenômeno das milícias no Rio de Janeiro é intrincado e multifacetado, refletindo uma relação complexa entre poder político, controle territorial e dinâmica social. A análise de especialistas é fundamental para a compreensão desse desafio que afeta a vida de milhares de cariocas.

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