A análise da gestão que o economista Gabriel Galípolo poderá implementar à frente do Banco Central é um tema de profundo interesse, especialmente considerando sua identidade vinculada a propostas econômicas mais heterodoxas, contrastando com as limitações inerentes ao setor público. Essa perspectiva é compartilhada por Luis Gonzaga Belluzzo, que caracteriza o estilo de Galípolo como reflexo de sua expertise acadêmica e seu comprometimento institucional. Nomeado pelo presidente Lula para suceder Roberto Campos Neto a partir de 2025, Galípolo traz consigo uma trajetória que combina formação teórica robusta e experiências práticas no governo, gerando expectativas sobre como ele pode efetivamente equilibrar suas convicções econômicas com as responsabilidades de um servidor público.
Com 42 anos, Galípolo recentemente fez parte da diretoria de Política Monetária do Banco Central. Nesse papel, suas posturas mostraram-se mais alinhadas com uma abordagem ortodoxa em relação à política monetária, defendendo, por exemplo, que a taxa Selic poderia ser aumentada para conter a inflação, uma afirmação que poderia ser vista como desacordo com os anseios do presidente Lula. Esse comportamento sugere que Galípolo poderá operar mais como um gestor pautado pela pragmática da administração pública do que como um ideólogo estrito das teorias econômicas.
A reação imediata nos mercados, expressa na alta da cotação do dólar após a sua indicação, reflete certo descontentamento entre investidores e analistas. No entanto, essa reação pode não considerar a segunda característica fundamental ressaltada por Belluzzo: a ideia de que, ao ocupar um cargo público, o compromisso institucional deve prevalecer sobre as preferências pessoais e acadêmicas. Galípolo não é apenas um economista cujo espectro ideológico é mais à esquerda, mas sim uma figura que se distingue pela complexidade de sua experiência e formação, indo além dos estereótipos típicos de quem assume tal posição.
Neste contexto, as particularidades da carreira de Galípolo merecem destaque. Ele não é um funcionário de carreira do Banco Central, nem sua trajetória no setor financeiro foi a mais tradicional para um líder da instituição. Após se formar em economia na PUC-SP e concluir um mestrado na mesma instituição aos 25 anos, Galípolo começou sua carreira pública como chefe da assessoria econômica da Secretaria dos Transportes de São Paulo, durante o governo de José Serra. Sua passagem posterior pela Unidade de Estruturação de Projetos na Secretaria de Economia e Planejamento ampliou ainda mais sua experiência em gestão pública.
Galípolo é também associado a um grupo de economistas da Escola de Economia da FGV-SP, conhecido por suas visões desenvolvimentistas, que foram influentes na sua formação. Durante sua trajetória, ele se envolveu em discussões que moldaram sua abordagem sobre desenvolvimento econômico e política pública. José Márcio Rego, um colega do grupo, descreveu Galípolo como um “heterodoxo, mas não ortodoxo”, ressaltando sua habilidade de diálogo e capacidade de ouvir opiniões diversas, uma qualidade geralmente valorizada na administração pública.
A passagem de Galípolo pelo Banco Fator, onde atuou por quatro anos, permitiu que ele aplicasse suas ideias sobre parcerias público-privadas em projetos significativos, incluindo concessões no transporte público de São Paulo e na Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro. Essa experiência prática pode se revelar crucial à frente do Banco Central, onde questões de investimento e infraestrutura são inevitavelmente interligadas à política econômica.
Além de suas contribuições ao setor público, Galípolo se destacou também no campo acadêmico, ao longo de sua colaboração com Belluzzo, com quem escreveu vários livros que exploram temas econômicos sob uma luz crítica e intelectual, revelando sua perspectiva heterodoxa. A produção literária inclui títulos provocativos que não apenas discutem a economia contemporânea, mas também se detêm sobre questões estruturais e ideológicas, demonstrando uma preocupação ampla sobre a natureza do capitalismo atual.
Com um histórico de interação próxima com Lula — a quem conhece há décadas — e participação ativa em eventos relacionados ao governo, a ascensão de Galípolo na administração pública foi notável. Sua participação na equipe de transição do governo e sua subsequente direção executiva na Fazenda são exemplos concretos de sua crescente influência no cenário econômico brasileiro. Assim, a expectativa é que sua liderança no Banco Central não só traga um olhar renovado para a política monetária, mas também promova um diálogo contínuo sobre como as ideias econômicas podem interagir com as necessidades do país em um momento em que as ressalvas sobre inflação e crescimento são mais relevantes do que nunca.