Uma das recomendações clássicas para garantir uma boa higiene do sono é evitar a prática de exercícios físicos durante a noite. No entanto, um estudo recente divulgado na revista BMJ Open Sport & Exercise Medicine aponta que a realização de exercícios de resistência com o peso corporal à noite pode, na verdade, otimizar a qualidade do sono e ajudar a combater o sedentarismo, um problema crescente na sociedade contemporânea.
Para investigar essa hipótese, pesquisadores da Universidade de Otago, na Nova Zelândia, conduziram um experimento com 28 voluntários. Os participantes foram submetidos a sessões de apenas três minutos de exercícios simples de resistência, como agachamento na cadeira, elevação de panturrilha e elevação de joelho em pé, em intervalos de 30 minutos ao longo de quatro horas, iniciando às 17h. Em outra fase do estudo, a equipe avaliou o mesmo grupo após um período em que permaneceram em uma posição sentada pelo mesmo tempo, o que representa um comportamento sedentário.
Os dados coletados mostraram que os voluntários que realizaram os exercícios relataram uma melhoria significativa em sua qualidade de sono, dormindo em média 29,3 minutos a mais do que nas noites em que ficaram sentados por longos períodos. Não foram observadas diferenças relevantes na eficiência do sono — que avalia a proporção entre o tempo em que a pessoa está na cama e o tempo efetivamente dormido — nem no número de vezes que acordaram durante a noite.
Os pesquisadores ainda destacam que a prática excessiva de comportamentos sedentários pode estar associada a riscos aumentados de problemas de saúde, como diabetes e doenças cardiovasculares. Desta forma, os resultados deste estudo servem como um incentivo à atividade física noturna. Exercícios simples utilizando o peso corporal exigem pouco espaço e não necessitam de equipamentos, permitindo que as pessoas pratiquem em casa, sem comprometer seus momentos de lazer, como assistir televisão.
O pneumologista Marcelo Rabahi, especialista em medicina do sono do Hospital Israelita Albert Einstein, comenta sobre as implicações dessas descobertas. Segundo ele, enquanto a recomendação de evitar exercícios à noite é válida para atividades mais intensas e extenuantes — como natação, ciclismo e corrida —, a prática de exercícios leves ou moderados pode ser benéfica. Isso se deve ao fato de que a atividade física leve não eleva a adrenalina a níveis que comprometam a qualidade do sono.
“Exercícios de impacto ou de alta intensidade realizados próximos da hora de dormir podem, de fato, interferir no sono. No entanto, se o único momento que a pessoa tem disponível é à noite, vale a pena considerar que os benefícios para a saúde superam esses potenciais riscos”, esclarece Rabahi. Muitas pessoas conseguem se adaptar a essa rotina e relatam noites de sono satisfatórias, mesmo incluído treinos mais próximos do horário de dormir. Para aqueles que ainda não têm uma prática regular de exercícios, essa pode ser uma excelente maneira de começar.
Entretanto, Rabahi alerta os indivíduos que, ao iniciar essa rotina, possam desenvolver sintomas como insônia ou sonolência excessiva durante o dia. Nestes casos, a orientação é procurar um médico para uma avaliação detalhada. “Durante a consulta, serão investigadas várias causas para a insônia e, possivelmente, identificar como as atividades físicas noturnas estão impactando a qualidade do sono”, afirma o especialista.
Além do tempo total de sono, o que realmente compromete a qualidade do descanso noturno são os “microdespertares”, que são breves interrupções no sono que passam despercebidas. Estas interrupções podem ser mais comuns em pessoas que sofrem de apneia do sono, síndrome das pernas inquietas e outros distúrbios relacionados ao sono. Rabahi explica que uma pessoa que dorme por oito horas, mas enfrenta 50 microdespertares em uma hora pode ter sua qualidade de sono comprometida, ficando atrás de alguém que dorme apenas seis horas de forma contínua.
Portanto, é fundamental adotar hábitos que favoreçam um sono reparador, incluindo a prática de atividade física à noite, desde que essa não seja uma barreira. “Essa deverá ser uma boa alternativa para aquelas pessoas que não devem ver o exercício como um fator que poderia interferir na qualidade do sono. O ideal é realizar atividades em um ritmo que se sinta confortável e tentar respeitar um intervalo de quatro horas antes de dormir. Caso perceba dificuldades para adormecer, será necessário reavaliar tanto a intensidade dos exercícios quanto a adequação do horário”, finaliza Rabahi.