Um Cenário de Ceticismo e Busca por Veracidade

Uma pesquisa divulgada nesta segunda-feira (22/09) pelo InternetLab e a Rede Conhecimento Social revelou uma realidade alarmante: a desconfiança dos brasileiros em relação às informações que recebem no ambiente digital. O levantamento indica que, para a maioria dos entrevistados, a veracidade do que circula nas redes sociais e em aplicativos de mensagens é uma preocupação constante, refletindo a crescente disseminação de notícias falsas. O estudo destaca que, mesmo com um comportamento ativo por parte dos usuários na checagem de informações, a qualidade na verificação ainda enfrenta desafios significativos.

Com a intenção de validar dados antes de compartilhar, 64% dos brasileiros recorrem ao Google, seguidos por 45% que fazem pesquisa no Instagram, 43% no YouTube e 23% no Facebook. Esse comportamento, de acordo com Ester Borges, consultora de desinformação do InternetLab, é um ponto positivo: “Os usuários estão mais ativos e buscando confirmar se as informações são verdadeiras ou não. Entretanto, os canais que utilizam para essa checagem muitas vezes não têm a confiabilidade necessária.”

Ainda segundo a pesquisa, 34% dos entrevistados consideram que as informações obtidas por meio de buscas online são mais confiáveis do que aquelas apresentadas nas redes sociais ou mesmo em veículos tradicionais, como rádio e TV, que têm uma taxa de confiança de 27%. Em contrapartida, aplicativos de inteligência artificial ainda são vistos com desconfiança, com apenas 16% dos brasileiros considerando suas respostas como confiáveis.

Pessoas como Referências de Confiança

A pesquisa também revelou que os brasileiros tendem a formar seus próprios ecossistemas de confiança na internet. Especialistas são frequentemente consultados, mas familiares e amigos ocupam posições de maior credibilidade. Três em cada dez pessoas confiam na veracidade de uma notícia apenas porque foi enviada por alguém em quem confiam. Além disso, 80% dos entrevistados na América Latina afirmaram que os comentários em postagens podem servir como uma forma de validação da informação.

Marisa Villi, diretora-executiva da Rede Conhecimento Social, alerta para o risco de que essas referências de confiança pertençam a uma mesma bolha, reforçando crenças já existentes e limitando a diversidade de ideias. Essa bolha de informação é um fenômeno digital em que algoritmos de redes sociais e mecanismos de busca expõem os usuários apenas a conteúdos que corroboram suas opiniões, criando barreiras para a pluralidade de pensamentos.

Confiança em Temas Sensíveis

O estudo também aponta que, ao abordar temas como política e saúde, há uma clara tendência de cautela por parte dos usuários. Neste contexto, familiares e amigos são considerados mais confiáveis: 31% dos brasileiros confiam em parentes quando o assunto é saúde, e 24% consideram familiares como fonte confiável em questões políticas. Os jovens, por outro lado, são os que menos buscam informações em diversas fontes; aqueles entre 45 e 54 anos, com ensino superior, são os que mais diversificam suas pesquisas.

Apesar do comportamento ativo na busca por informações, especialistas ressaltam a importância de criar mecanismos que tornem esse processo de checagem mais eficaz e seguro. Heloisa Massaro, do InternetLab, menciona: “É fundamental como furar essa bolha e tornar o ecossistema de informação mais íntegro. A regulamentação das plataformas, com transparência nos resultados de busca, e a inclusão de rótulos indicando a confiabilidade do conteúdo são caminhos necessários.”

Rotulação e o Combate às Fake News

A pesquisa também examinou a questão da rotulação de conteúdos. Nove em cada dez pessoas na América Latina afirmaram que não compartilham notícias ou postagens identificadas como falsas ou manipuladas pelas plataformas. Esse dado demonstra que a rotulação pode ser uma estratégia eficaz para combater a disseminação de informações falsas. Borges sublinha: “A rotulação realmente faz a diferença e pode impedir que as pessoas compartilhem conteúdos enganosos. Portanto, as plataformas têm um papel crucial na redução das fake news.”

O estudo entrevistou 6.065 pessoas no Brasil e outros 18 países da América Latina e Central, com idade acima de 18 anos, acesso à internet e uso ativo de redes sociais. A coleta dos dados ocorreu em 2024, refletindo um panorama diversificado em termos de raça, gênero, classe social e posicionamento político dos participantes.

O Desafio da Desinformação

Diante do fluxo incessante de informações, o grande desafio para os usuários é distinguir o que é verdadeiro e o que é falso. Uma pesquisa do Instituto Locomotiva, realizada no ano passado, revelou que 88% da população brasileira admitiu já ter acreditado em informações que eram falsas. Especialistas afirmam que essa desinformação se intensifica com a facilidade de criação de conteúdos nas redes sociais, transferindo para os usuários a responsabilidade de verificar a veracidade das informações, algo que nem sempre ocorre.

“Muitas pessoas supõem que se receberam uma informação é porque ela foi checada por alguém, o que não é o caso. O perigo está em que esse processo pode moldar suas visões de mundo e suas opiniões de maneira distorcida”, adverte um especialista ouvido pela reportagem.

Além disso, compreende-se que os algoritmos das redes sociais desempenham um papel fundamental nessa dinâmica. Eles determinam quais conteúdos são apresentados aos usuários com base em suas interações, priorizando a retenção e engajamento. Assim, as redes sociais oferecem conteúdos que reforçam crenças previamente estabelecidas, dificultando a exposição a perspectivas alternativas, o que representa um perigo para o pluralismo da informação.

Fabiano Carvalho, especialista em Transformação Digital, conclui: “Os algoritmos de engajamento favorecem conteúdos que geram cliques, criando um ciclo de desinformação que pode ter consequências graves na formação da opinião pública.”

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