Ampliação da Licença-Paternidade: Um Passo Importante
A Câmara dos Deputados deu um passo significativo ao aprovar, antes do recesso parlamentar, a urgência para um projeto de lei que busca aumentar a licença-paternidade no Brasil para 15 dias. Essa mudança, que promete não impactar a remuneração dos pais, também garante estabilidade no emprego por 30 dias após o término da licença.
Com a urgência aprovada, a proposta, que já recebeu aval do Senado e está tramitando no Congresso desde 2008, pode ser votada diretamente no plenário, pulando as comissões temáticas. A expectativa é que essa votação aconteça já em agosto, com o retorno dos deputados após o recesso.
A urgência foi estabelecida em 16 de julho, logo após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter estipulado um prazo para que o Congresso se manifestasse sobre a regulamentação da licença-paternidade, conforme preconiza a Constituição.
Atualmente, os pais brasileiros têm direito a cinco dias corridos de licença remunerada após o nascimento ou adoção de um filho. As empresas que participam do Programa Empresa Cidadã podem estender esse prazo para até 20 dias.
Se aprovada a extensão para 15 dias, o Brasil passará a atender ao padrão mínimo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que sugere um mínimo de 14 dias de licença-paternidade. Contudo, organizações da sociedade civil que defendem a ampliação da licença alertam que esse prazo é insuficiente e promovem a aprovação de outros projetos de lei que propõem a licença-paternidade de até 30 a 60 dias.
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“Embora este projeto [PL 3.935/2008] já tenha sido aprovado no Senado, ele está estagnado desde 2008 e não atende às demandas contemporâneas de crianças, famílias e da sociedade”, afirmou Caroline Burle, presidente adjunta da Coalizão Licença-Paternidade (CoPai).”Um período de 30 dias de licença-paternidade é o mínimo para começarmos a transformar a cultura vigente e incentivar os pais a se envolverem mais no cuidado dos filhos.
Pais em países como Espanha (16 semanas com 100% de remuneração), Islândia (26 semanas com 80% da remuneração) e Suécia (90 dias para cada pai e 300 dias adicionais compartilháveis com 80% da remuneração) desfrutam de licenças-paternidade mais generosas. Assim, o debate sobre a ampliação da licença no Brasil ganha relevância, já que a experiência internacional demonstra que prazos mais longos trazem benefícios não apenas para as famílias, mas também para as empresas e para o país.
Estudos realizados pelo Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made-USP) apontam que a licença-paternidade é uma política crucial que busca corresponsabilizar o cuidado familiar, promovendo melhor divisão do trabalho entre pais e mães. Luiza Nassif Pires, co-diretora do Made, explica que a regulamentação da licença é historicamente importante, pois responde à necessidade de um maior comprometimento dos pais na educação dos filhos.
Entretanto, a proposta enfrenta desafios, incluindo os custos associados à extensão da licença para a Previdência e a resistência de setores empresariais que temem impactos negativos, especialmente nas pequenas empresas, responsáveis por grande parte dos empregos no Brasil.
Benefícios da Ampliação da Licença-Paternidade
Visando embasar o debate em torno da proposta na Câmara, o estudo do Made-USP analisa a licença-paternidade estendida sob cinco aspectos: a situação de pais e mães no mercado de trabalho; a divisão das responsabilidades domésticas e de cuidado nas famílias; o vínculo entre pais e filhos e o desenvolvimento infantil; a taxa de fertilidade; e o impacto nas empresas.
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Os pesquisadores também investigam se os pais realmente utilizam a licença-paternidade remunerada quando disponível. A literatura acadêmica indica que sim, desde que a licença seja unicamente destinada aos homens, de forma intransferível às parceiras.
No cenário da América Latina, apesar da recomendação da OIT para um mínimo de 14 dias de licença-paternidade, apenas Cuba, Venezuela e Paraguai atendem a essa norma. Em Cuba, pais e mães podem compartilhar uma licença que se estende até 365 dias com 60% do salário. Contudo, entre 2003 e 2014, apenas 124 homens requisitaram a licença-paternidade no país. No Uruguai, em 2015, somente 2,6% dos homens utilizaram a licença, enquanto no Chile essa taxa foi de apenas 0,2%.
A pesquisa também revela que licenças-paternidade no formato “tire ou perca” têm sido mais eficazes em vários países, incentivando os homens a reivindicar esses direitos.
Em relação ao impacto da licença-paternidade sobre os empregos, a maioria dos estudos revela que a licença não gera discriminação dos empregadores em relação aos pais, nem resulta em queda de salários ou em prejuízos nas carreiras. No entanto, a extensão do benefício traz vantagens significativas para as mulheres, melhorando seus rendimentos e aumentando o percentual de trabalhadoras formais.
Além disso, a licença-paternidade influencia positivamente na divisão de tarefas domésticas e na participação dos homens no cuidado das crianças, um aspecto que pode ter implicações a longo prazo. Diversas pesquisas internacionais apontam que o desenho da política de licença, aliada à sua duração e ao suporte institucional, afeta diretamente o envolvimento dos pais com os filhos. Para ilustrar essa transformação, Rodrigo Mieldazis, gerente de crescimento de receitas na Diageo, compartilha sua experiência pessoal ao utilizar a licença-paternidade de seis meses. Ele percebeu não apenas a carga de trabalho que envolve cuidar de crianças, mas também a importância de sua presença no desenvolvimento de vínculos afetivos com suas filhas.
Os dados sugerem que a maior presença dos pais, possibilitada pela licença-paternidade, está correlacionada com melhores resultados cognitivos, desempenho escolar e desenvolvimento emocional das crianças. Além disso, a participação ativa dos pais na criação dos filhos está associada a uma redução da violência doméstica.
O Cenário Atual no Congresso e os Próximos Passos
No contexto atual, 50 projetos sobre licença-paternidade estão em trâmite na Câmara, além de sete no Senado, de acordo com levantamentos recentes. O projeto que teve a urgência aprovada em julho é o mais antigo, com mais de 100 propostas apensadas.
Recentemente, um grupo de trabalho da Secretaria da Mulher da Câmara, liderado pela deputada Tábata Amaral, formulou uma proposta que prevê a extensão da licença-paternidade para 30 dias inicialmente, aumentando gradualmente até 120 dias, conforme a situação. Este projeto é apoiado por diversas organizações da sociedade civil.
Por sua vez, no Senado, um projeto de Jorge Kajuru avançou, prevendo também uma licença inicial de 30 dias, com a perspectiva de aumento. O texto aguarda análise na Comissão de Constituição e Justiça.
As próximas semanas são cruciais. As organizações que defendem uma licença mais longa estão mobilizadas para influenciar a votação na Câmara, visando assegurar que o período mínimo proposto pela legislação seja de 30 dias. O ideal é que um substitutivo seja criado, levando em consideração as demandas sociais e os anseios de mudança na política de licença-paternidade.