O furacão Ernesto provocou severos danos em Porto Rico, em pleno mês de agosto. Apesar de ser classificado com a menor avaliação na escala Saffir-Simpson — a classificação oficial utilizada para categorizar furacões — devido à sua velocidade de vento que alcançou 120 km/h, essa tempestade evidenciou como furacões, mesmo com classificações mais baixas, podem infligir estragos imensos. Embora a escala Saffir-Simpson tenha sido uma ferramenta padrão para mais de 50 anos, novas pesquisas indicam que talvez seja hora de reconsiderar as metodologias utilizadas para avaliar a severidade de furacões, especialmente em um contexto de mudanças climáticas, onde tem-se observado um aumento na intensidade das tempestades.
A escala Saffir-Simpson é fundamentalmente baseada na velocidade dos ventos, que é medida por aviões equipados com instrumentos científicos, enviados pela Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA). Esses aparelhos lançam sondas durante o voo, coletando dados sobre pressão atmosférica e velocidade do vento em diferentes altitudes. vale ressaltar que a escala abrange categorias que vão de 1 a 5, sendo a última a mais devastadora. No entanto, essa ferramenta não contempla outros efeitos críticos, como marés de tempestade, chuvas intensas ou inundações, que são, muitas vezes, responsáveis pelos maiores estragos e perdas de vidas durante um furacão.
Estudos mostram que a maior parte das fatalidades associadas a furacões ocorre devido a afogamentos, que resultam das inundações causadas pelas chuvas e do aumento do nível do mar durante as tempestades. Especialistas destacam que 90% das mortes relacionadas a ciclones tropicais se originam da água, o que torna a medição apenas do vento uma visão incompleta do real potencial destrutivo desses fenômenos climáticos. Segundo Michael Wehner, cientista do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, a avaliação tradicional falha em considerar que a maior parte dos danos resulta das condições hídricas, e não apenas das velocidades dos ventos.
Historicamente, furacões que atingiram a categoria 1 na escala Saffir-Simpson, como o furacão Sandy, geraram enorme devastação em virtude das inundações, apesar de suas velocidades de vento serem relativamente modestos. O Sandy, por exemplo, provocou danos avalizados em US$ 88,5 bilhões, demonstrando que a intensidade do vento nem sempre se correlaciona com a destruição. Assim, diversos especialistas propõem novas metodologias de avaliação que levem em conta também o tamanho e a dispersão dos ventos, não somente a velocidade máxima.
Vasu Misra, professor de meteorologia, criticou a falta de consideração por esses fatores na escala Saffir-Simpson e apresentou uma proposta conhecida como Energia Cinética Integrada Rastreada, que visa medir não apenas a intensidade dos ventos, mas também sua extensão e duração. Essa abordagem mais abrangente poderia utilizar dados de satélites para melhor observar as características de um ciclone, embora enfrente desafios, como limitações na cobertura do satélite e custos associados à implementação de novas tecnologias. Inovações como drones, que coletam dados em tempo real sobre a intensidade de furacões, estão surgindo como possíveis soluções, mas ainda enfrentam limitações financeiras e operacionais.
A visão emergente entre os climatologistas propõe não apenas uma revisão da escala, mas que essa revisão inclua uma abordagem centrada nas pessoas, ao invés de nos fenômenos em si. O cientista Kerry Emanuel sugere que sistemas de alerta possam se basear em cores — semelhante ao que já ocorre em alguns países — para transmitir claramente a magnitude do risco para a população, ao invés de se aferir categoricamente os furacões por número. Uma comunicação focada nos impactos reais que essas tempestades podem causar poderia auxiliar a população a tomar decisões informadas e oportunas em situações de risco.
Além disso, enquanto futuristas sugerem a introdução de uma categoria 6 na escala, para acomodar furacões crescentemente potentes, especialistas chamam a atenção para os riscos que isso pode acarretar, como a diminuição da percepção de gravidade de furacões já categorizados. A real adaptabilidade do sistema e a eficácia de alertas continua sendo um tema de debate intenso em meio à evidência de que as mudanças climáticas estão afetando a frequência e a intensidade dos furacões.
Os especialistas solicitam uma revisão urgente nas formas de comunicar a ameaça dos furacões, fomentando um diálogo em torno da necessidade de informações mais robustas e significativas que realmente traduzam os riscos. As tecnologias atuais podem ser aliadas poderosas, mas a implementação de um sistema de comunicação que realmente se foque nos impactos para as pessoas pode ser a chave para salvar vidas durante essas devastadoras tempestades.